Queixas
sobre a atuação das juntas odontológicas na avaliação dos OPME nas cirurgias
ortognáticas em São Paulo. Conceito das informações assimétricas em falta[1].
Embora haja críticas justas sobre a falta de
transparência nos processos de juntas odontológicas, regidas pela Resolução
Normativa nº 424 da ANS, de 26 de junho de 2017, os cirurgiões solicitantes não
têm agido com precisão em seus pedidos endereçados às maiores operadoras de
saúde do Brasil. Após a redação de laudos para a Justiça Cível de São Paulo,
tenho notado falhas recorrentes que atrasam os processos administrativos e
impedem a cirurgia ortognática de seus clientes.
Obviamente, as operadoras desejam reduzir os
custos quando os OPME são solicitados. Mas os dentistas são descuidados e
permitem muitas brechas para juntas odontológicas (JO) mal-intencionadas usem o
mínimo de esforço para negar a cirurgia.
No entanto, o cirurgião bucomaxilofacial deve aprender
o conceito de informações assimétricas. Este conceito foi apresentado em um
artigo de um ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2001, Prof. George A.
Akerlof, no texto[2]
The Market for "Lemons": Quality Uncertainty and the Market
Mechanism.
O cirurgião sabe tudo sobre a patologia de seu
paciente: a duração, os tratamentos prévios que falharam, o tratamento atual
que se pretende, os exames complementares usados para se chegar ao diagnóstico.
Embora, raramente tenha o ânimo de informar à JO todas essas informações. Logo,
a junta pouco sabe sobre o caso e o cirurgião não a instrui com os textos,
documentos e exames necessários. A analogia se faz ao mercado de carros usados.
O vendedor sabe tudo sobre os problemas do carro que pensa em vender. Já o
comprador, quase nada sabe. No idioma inglês, o mercado de limões se refere aos
carros ruins que estão no mercado, sem que o comprador possa ter acesso a todas
as informações sobre o estado do motor, suspensão, sistema elétrico. E o
vendedor pode omiti-los para cumprir sua intenção de venda.
Na Cirurgia Bucomaxilofacial ocorre o mesmo,
embora saiba tudo sobre o caso clínico, o cirurgião bucomaxilofacial não faz
qualquer esforço para instruir a JO. E acaba com seu pedido negado, levando a
um atraso na cirurgia e na necessidade da contratação de advogados pelo seu
paciente-cliente.
Uso de formulários pré-formatados, embora
pareça prático, a falta de revisão leva o pedido para patamares maiores de
preço e posso citar como exemplo mais comum, a falta de apagar uma linha, usada
em um pedido anterior, com o pedido de enxertia de crista do ilíaco. Essa
grande falha muda o rumo da cirurgia, pois aumenta a complexidade dela com a
suposta da necessidade de uma equipe médica de Ortopedia. Pedidos que contenham
uma linha não revisada, com uma menção errada à necessidade da retirada do osso
do quadril fizeram com que os desempatadores tenham usado isso para bloquear o
andamento do processo. E com razão por que a cirurgia ortognática tomará outro
rumo. Logo, uma simples revisão, com o apagamento da simples linha poderá
economizar tempo.
A falta de enumeração dos exames complementares
é um obstáculo que dá margem às juntas para negativas. O pedido do cirurgião
não descreve ou não anexa as imagens que gostaria que a JO deveria observar. Às
vezes, há o contentamento em escrever algo como: todos os exames acompanham.
Para se evitar atrasos, esses exames devem ser enumerados e datados, p.ex.
tomografia datada em 25 de abril de 2018 acompanha o pedido, de modo a evitar
generalizações na especificação dos exames.
A falta de assinaturas datadas, com o
carimbo do cirurgião vem como recorrente. Isso dificulta na apuração pericial,
para se formular uma cronologia e dar razão aos especialistas em CTBMF. É um
dos erros mais comuns notados.
A falta de um pedido de intenção de que o
paciente seja avaliado presencialmente. A troca de mensagens entre cirurgião e
operadora se dá por e-mail, mas raramente há a intenção de que
seu paciente seja avaliado em pessoa, quer pelo desempatador, quer pela
operadora. Em entrevista com pacientes, dizem que nunca foram a qualquer
consultório para serem avaliados. Embora muitos desempatadores usem a
prerrogativa da RN nº 424, a avaliação indireta torna-se muito cômoda e permite
com que mais relatórios denegatórios sejam produzidos diariamente, o que
aumenta os ganhos do desempatador. Um artifício que pode ser usado seria pedir
que a junta odontológica apresente uma foto do paciente em seu relatório, de
modo a obrigá-los e atender presencialmente o beneficiário do plano de saúde.
Quando a operadora oferece o nome de três ou
quatro desempatadores, raramente vejo dentistas que escolhem um deles. Esta é
outra prerrogativa que pode ser usada em favor de seu paciente.
Quando se trata de cirurgias ortognáticas, o
cirurgião costuma a mandar uma lista padrão do OPME, sem preocupar-se em
adequar ao caso tratado. Muitas vezes, materiais caros está na lista e que não
serão usados, e como melhor exemplo cito próteses customizadas, que sequer
serão usadas. O alto custo da prótese customizada serve para a junta justificar
que as próteses de prateleira possam se usadas, sem justificativas. Fica
prático negar.
A organização dos pedidos de internação deve
ser regra, sem deixar espaços para más intenções de juntas odontológicas
duvidosas. Outra boa prática, rara também, é a possibilidade de se perguntar
por escrito questões que devem ser respondidas pela JO. Isso obriga a junta a atentar-se,
portanto. É um artifício valioso e quase nunca usado pelo cirurgião. Considero
essencial questionar a JO por escrito.
Caso todas essas sugestões sejam lançadas nos
pedidos, nada garante a aprovação do pedido. Consequentemente, começam as
batalhas de liminares judiciais e tenha certeza que existem muitos julgamentos
e súmulas que já pacificaram o supremacia do cirurgião assistente sobre as negativas
arbritárias da juntas. Destaque para a mais importante delas, dentro do TJ-SP:
Súmula 102: Havendo expressa indicação médica,
é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da
sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da
ANS.
Então, já existe vantagem jurisprudencial para
o paciente, mas que não vem sendo usada da melhor forma pelos cirurgiões CTBMF
do Estado de São Paulo.
Foi minha análise.
São Paulo, 3 de novembro de 2024
(assinatura digital)
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