sexta-feira, 7 de março de 2025

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Nosso livro sobre a introdução ao universo pericial judicial.

 

    
    

Nosso livro sobre a introdução ao universo pericial judicial. Disponível no Hotmart para compra.

Introdução à Perícia Judicial em Odontologia, e-book por André Amaral

andreamaralribeiro@hotmail.com



Analgesia em casos agudos em Endodontia.

 


 

Fevereiro de 2025, por André Eduardo Amaral Ribeiro, dentista.

Contarei minha experiência nos últimos onze anos na clínica odontológica de um serviço público, unidades na Prefeitura de São Paulo e Taboão da Serra, uma cidade vizinha da Capital. É minha opinião e as observações, prevalência delas foram todas colhidas por fichas assinadas.

O que comumente nos traz o paciente ao serviço de urgência é a especialidade da Endodontia. As queixas comuns são dores lancinantes (em forma de pontada de lança, esse é o significado lexical da palavra que ser origina de lança), seguida de queixas de insônia. Os pacientes costumam a se medicar com os fármacos, nesta ordem: dipirona sódica, amoxicilina (uma crença errônea da população), ibuprofeno, diclofenaco ou nimesulida. A maioria foi atendida nos sábados, domingos, noites ou madrugadas em serviços médicos. A maioria não foi atendida por um dentista nestes horários, por terem o primeiro contato com médico plantonista, sem especialidade conhecida. Considero o uso da amoxicilina irrelevante para analgesia em dores pulpares ou periapicais.

Normalmente, nos hospitais, os médicos prescrevem antibióticos (a grande maioria a própria amoxicilina) e nimesulida via oral. A medicação injetável raramente é prescrita. Muitas vezes recebo telefonemas de médicos que estão de plantão, grande parte no sábado ou domingo, depois dos quais indico a medicação injetável: Profenid 100 mg (cetoprofeno) ou Voltaren 75 mg (diclofenaco sódico), que são de analgesia rápida para o paciente em sofrimento álgico.

Convém relembrar[1]:

 A anamnese é a base da consulta odontológica inicial, que tem por objetivo colher informações para formar um ou mais hipóteses diagnósticas. Aos mesmos tempos, permite que o cirurgião-dentista comece a delinear o perfil do paciente que será tratado sob sua responsabilidade profissional. Nessa direção, é recomendável que paciente seja classificado de acordo com seu estado de saúde geral ou categoria de risco médico. A American Society of Anesthesiologists adota um sistema de classificação de pacientes com base no estado físico, daí a sigla ASA-OS. Por este sistema, nos Estados Unidos, os pacientes são distribuídos em seis categorias, denominadas de P1 a P6. No Brasil, ainda prevalece apenas o uso do acrônimo ASA (de I a VI). Ressalte-se que essa classificação foi designada para adultos.

ASA-I: paciente saudável, que de acordo com a história médica não apresenta nenhuma anormalidade. Não mostra ansiedade, sendo capaz de tolerar muito bem o estresse ao tratamento dentário, com risco mínimo de complicações. São excluídos pacientes muito jovens ou muitos idosos.

ASA-II: paciente que sofre de doença sistêmica modera ou de menor importância que o ASA-I, por apresentar maior ansiedade ou medo do tratamento odontológico.

ASA-III: paciente que sofre de doença sistêmica severa, que limita suas atividades. Sendo imprescindível a troca de informações com o médico.

ASA-IV: paciente que sofre de doença sistêmica severa, que corre o risco de morte. Quando possível, os tratamentos dentários devem ser postergados. As urgências odontológicas, como dor e infecção, devem tratadas da maneira mais conservadoras que a situação permita.

ASA-V: paciente em fase terminal.

ASA-VI: paciente com morte cerebral decretada.

Cerca de dois terços dos pacientes recorrem à automedicação, ante ao desespero da dor. Um terço consome dipirona em superdoses: cem gotas, cento e vinte gotas. A dose de 1000 mg é indicada a cada seis horas. Colhi opiniões de colegas médicos que prescrevem 2000 mg em hospitais, por via endovenosa de dipirona sódica. Nunca prescrevi essa dose de 2 g. Quando ouço que o paciente se automedicou com dipirona, oriento que a dipirona não é um fármaco com eficácia anti-inflamatória. Oriento que para dores de dente inespecíficas, o efeito anti-inflamatório será necessário.

Quanto às prescrições, no livro[2] temos:

 

Os AINEs (anti-inflamatórios não esteroidais) são indicados para o controle da dor aguda de intensidade moderada a severa, no período pós-operatório de intervenções odontológicas eletivas, tais como exodontia de inclusos, as cirurgias periodontais, a colocação de implantes múltiplos, os procedimentos de enxertia óssea etc. O regime mais eficaz com os AINEs é de analgesia preventiva, introduzindo imediatamente após a lesão tecidual, porém antes do início da sensação dolorosa. Em termos práticos, a primeira dose é administrada ao final do procedimento (paciente ainda sob os efeitos da anestesia local), seguidas das doses de manutenção, por curto período. Os AINEs também podem ser úteis no controle da dor já instalada, decorrentes de processos inflamatórios agudos (p.ex. percicementites), como complemento dos procedimentos de ordem local.


E outro texto sobre a má-prática[3] :

 

Evitando lesões por negligência durante a terapia endodôntica - A consideração mais importante seguir as diretrizes e protocolo padrão durante a realização do tratamento endodôntico. A observação dos protocolos de tratamento está associada ao compromisso com qualidade do resultado do tratamento, o que pode levar a processos cíveis indenizatórios. A grande maioria das lesões resultantes da má prática do tratamento endodôntico foi considerada evitável. O conhecimento atualizado do assunto e a competência de habilidades também são um dos fatores na prevenção da negligência endodôntica e permite que os profissionais diagnostiquem, planejem o tratamento e realizem o procedimento endodôntico com os prognósticos desejados. Portanto, as habilidades técnicas dos endodontistas devem ser aprimoradas com experiência de trabalho supervisionada, workshops e atividades de desenvolvimento profissional contínuo. Para reduzir a probabilidade de processos judiciais, o plano de tratamento endodôntico, o prognóstico e todas as complicações possíveis devem ser discutidos com o paciente, seguidos da assinatura de um consentimento informado por escrito. Além disso, a Associação Americana de Endodontistas forneceu um formulário de avaliação para avaliar a dificuldade do caso, que é uma ferramenta valiosa para prever as possíveis complicações e contratempos. Usar o isolamento do dique de borracha para minimizar o risco de infecção cruzada e prevenir a inalação ou ingestão acidental de instrumentos endodônticos de materiais dentários, que é sempre recomendado. As variações anatômicas nas raízes e na morfologia do canal radicular são comuns. Portanto, as radiografias pré-operatórias são essenciais e auxiliam os operadores no diagnóstico correto da extensão da cavidade de acesso e instrumentação dos canais radiculares. Além disso, as radiografias ajudam a reduzir as chances de erros de procedimento, como perfuração, remoção ou formação de saliências. Se disponível, o dentista deve considerar o uso de equipamentos avançados (como sistemas rotativos bem controlados e tomografia computadorizada de feixe cônico), pois o uso de tais tecnologias reduz o risco de erros de procedimento e má-prática odontológica.

 

 

Vou classificar a analgesia de: antiinflamatórios não esterioidais (AINEs), antiiflamatórios esteroidais GC (glicocorticóides), analgésicos comuns e analgésicos de ação central. Escrevei sobre o cloridrato de tramadol como um analgésico de ação central. A classificação será quanto a potência analgésica que observei nesses onze anos, pois ingressei na Prefeitura de São Paulo em 2014, depois de ser aprovado no concurso público. Ainda dividiremos os analgésicos entre injetáveis e comprimidos/cápsulas/drágeas, ou via oral.

Então teremos:

Analgesia muito boa (++++): quatro cruzes.

Analgesia boa (+++): três cruzes.

Analgesia média (++): duas cruzes

Analgesia fraca (+): uma cruz.

 

FÁRMACOS INJETÁVEIS

Gosto bastante e prescrevo com frequência as injeções após a instrumentação de canais em pacientes que se queixam de uma dor com score sete ou maior, numa escala de zero a dez. Normalmente, se o paciente afirma insônia, sempre administro na via injetável.

Betametasona: suas apresentações mais famosas são Diprospan 7 mg (Dipropionato de Betametasona 2 mg + Fosfato Dissódico de Betametasona 5 mg). Mais raro é o Celestone 2 mg, nem sempre disponível no serviço público. Tem bom efeito analgésico e é rápido na via injetável. Como reações adversas: aumento do apetite e euforia leve. Pessoalmente, esse medicamento me causa uma cefaleia chata. Os pacientes costumam conhecer e o consideram um remédio muito forte, alguns tem medo dele por causa dessa fama. Uma ampola é necessária para tratar uma dor pós-instrumentação, flare up e dor pericementária (pericementite ou periapicite). Existe o Duoflam, Beta-Trinta e a versão genérica. (++++)

Dexametasona: sua apresentação mais famosa é o Decadron (Fosfato Dissódico de Dexametasona 4 mg ou 10 mg). Decadron é praticamente o sinônimo da dexametasona com ampolas com 2 ml ou 2,5 ml para a versão com 10 mg. Tem bom efeito analgésico e é rápido na via injetável. Como reações adversas: aumento do apetite e euforia leve. Pessoalmente, esse medicamento me causa soluços horríveis e incoercíveis, por isso não tomo essa medicação e prefiro a betametasona. Uma ampola de 4 mg é suficiente para tratar uma dor pós-instrumentação, flare up e dor pericementária (pericementite ou periapicite). A versão de 10 mg não é necessária, vez que 4 mg foram suficientes. A versão genérica é bastante comum nas UBS. (++++)

Diclofenaco[4]: sua apresentação mais famosa é o Voltaren (diclofenaco sódico 75 mg). Antigamente, existia a versão injetável de Cataflam (diclofenaco potássico), mas há anos não a encontro em farmácias ou unidades de saúde. É o fármaco mais barato e o que mais prescrevo na via interna, intramuscular no glúteo. A dose única costuma ser suficiente para tratar a dor relacionada à pulpite ou dor pós-instrumentação, flare up e dor pericementária (pericementite ou periapicite). Também prescrevo com frequência para evitar a dor pós-operatória nas exodontias com osteotomias, em destaque para os terceiros molares. O paciente precisou de uma dose no dia seguintes em menos de 2% das exodontias. Relativamente seguro, e o evento adverso mais comum é a epigrastalgia. (++++)

Cetoprofeno: também chamado de Profenid, comum em pós-operatórios hospitalares em Ortopedia, Cirurgia Geral e Otorrinolaringologia. A dose de 100 mg a cada doze horas, na veia, é aceitável. Tem a vantagem de uma posologia mais flexível com duas ou três doses diárias, se comparado às doses únicas do diclofenaco. A náusea, vômito ou dor epigástrica são as reações adversas mais comuns. A dose única costuma ser suficiente para tratar a dor relacionada à pulpite ou dor pós-instrumentação, flare up e dor pericementária (pericementite ou periapicite). Também prescrevo com frequência para evitar a dor pós-operatória nas exodontias com osteotomias, em destaque para os terceiros molares. Eficácia clínica analgésica equivalente ao diclofenaco injetável, segundo minhas observações. (++++).

Tenoxicam: a nome comercial Tilatil é o mais famoso, quase um sinônimo. Numa época que trabalhei num Serviço, eles tinham uma relação com um fabricante e havia duas modalidades de ampolas – 20mg ou 40 mg. Foi um medicamento que não vi boa resposta para o tratamento de dor endodôntica. Considero inferior em analgesia em relação ao diclofenaco 75 mg e o cetoprofeno 100 mg, ambos intramusculares nas especialidades de Endodontia e Cirurgia Bucal ou Maxilofacial. Desconselho essa medicação. (++ 40 mg ou + 20 mg)

Tramadol 100 mg injetável: não tive experiência suficiente para formar uma opinião.

Dipirona sódica injetável: em razão da falta de efeito anti-inflamatório, nunca prescrevi isoladamente. A escolha da dipirona sempre esteve associada ao corticoide, portanto, não pude formar uma opinião sobre ela em uso avulso. Normalmente, antes de mudar de fórmula, o Lisador era o “sinônimo” de dipiora, muito embora tenha seja medicamento com associações - Lisador Injetável 375mg de dipirona + 12,5mg de prometazina + 12,5mg cloridrato de adifenina, caixa com 3 ampolas com 2mL de solução de uso intramuscular ou intravenoso. Já o Lisador na fórmula acima, consegui bons resultados quando estudei no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo. No entanto, os casos eram exclusivos na Cirurgia Bucomaxilofacial. O Lisador era injetado a cada seis horas (750 mg de dipirona sódica), no leito hospitalar, com ótima analgesia. (++++)

Meloxicam: usei poucas vezes a versão injetável de 15 mg por ampola, em razão de ter recebido amostras do antigo Movatec. Agora, o Melocox é a marca mais comum no mercado. Em razão do pouco uso injetável, não pude classificá-lo nesta escala quatro graus de analgesia, embora via oral tenha se mostrado pouco eficaz.

Acredito que uma injeção em dose única de diclofenaco 75 mg ou cetoprofeno 100 mg seja suficiente após a instrumentação de canais infectados, pulpectomia ou penetração desinfetante em Endodontia. Como medicação de resgate, uma prescrição da mesma droga via oral para os quatro dias seguintes, ou diclofenaco sódico 50 mg a cada oito horas ou cetoprofeno 100 mg a cada doze horas, via oral para ambos. Atenção para a técnica[5] de injeção.

 

FÁRMACOS POR VIA ORAL

No ótimo livro de Farmacologia de Eduardo Dias de Andrade, capítulo 6, tabela 6.2, o professor apresenta como principais AINEs (anti-inflamatórios não esteroidais) os fármacos: cetorolaco (Toragesic); diclofenaco potássico (Cataflam); ibuprofeno (Advil); nimesulida; cetoprofeno; piroxicam; tenoxicam; meloxicam; celecoxibe (Celebra); Etoricoxibe (Arcoxia). Foda da lista temos: etodolaco, lornoxicam, loxoprofeno.

Assisti a um curso no ano passado, promovido pela Prefeitura de Taboão da Serra com a disciplina de Clínica Odontológica da FOUSP. Na ocasião, o professor Rodney concluiu: (a) ibuprofeno de 200 a 400 mg para dores leves e moderadas; (b) celecoxibe 200 mg ou 400 mg na dose inicial para dores intensas; (c) dipirona como droga para se associar e se alcançar analgesia mais eficiente; (d) paracetamol com codeína 30 mg (Tylex) para dores intensas. E de fato podemos associar celecoxibe com dipirona, ibuprofeno e dipirona, além dos casos de celecoxibe com codeína e paracetamol – esta última a minha preferida. No entanto, os pacientes costumam reclamar do preço. Não considero o celecoxibe como um bom analgésico, seu efeito contra a dor é fraco e eu classificaria como (+), uma das cruzes. Já associado, tem ótimo efeito anti-inflamatórios e a dipirona ou a codeína associada servem na fração analgésica e rápida da dor. Nos meu pacientes de exodontias de terceiro molar com osteotomia, na clínica particular, sempre prescrevo celecoxibe e deixo uma receita separada com o Tylex, para comprar se a dor se intensificar.

O curso da FOUSP não citou o uso de medicamentos injetáveis, já o livro do professor Andrade pontua bem no uso de injetáveis, o qual defende a aplicação do Diprospan (betametasona) antes do procedimento, como forma de analgesia preemptiva. Na literatura[6] sobre o controle da dor pós-operatória:

Tratamento da dor pós-operatória – Em implantodontia, diferentes classificações e mecanismos de supressão da dor podem ser usados. Um protocolo de controle de dor foi estabelecido, o que significa e padroniza os vários aspectos de alívio da dor:

1.                       Analgésicos não-opioides (paracetamol, ibuprofeno, naproxeno, cetoprofeno, piroxicam, nimesulida, celecoxibe, tramadol)

2.                       Analgésicos opioides (codeína).

3.                       Adjuvantes.

A estratégia do manejo da dor usando múltiplos analgésicos com diferentes mecanismos de ação é denominada terapia analgésica combinada. O objetivo de combinar diferentes tipos é aumentar o efeito analgésico e diminuir as possíveis reações adversar farmacológicas. Quando múltiplas drogas são usadas em combinação os efeitos aditivos e sinérgicos permitem o uso de doses menores de cada droga individual. Com a terapia combinada, o paracetamol e os anti-inflamatórios são usados somados a um opioide. (...) Devido ao efeito máximo do paracetamol e dos anti-inflamatórios não-esteroidais, incrementos na dosagem não fornecerão qualquer analgesia adicional; contudo irão aumentar os efeitos colaterais.

Minha experiência clínica classifica com potentes e rápidos analgésicos (++++): naproxeno sódico 500 ou 550 mg; diclofenaco sódico 50 mg; piroxicam[7] 20 mg; cetoprofeno 50 ou 100 mg; codeína 30 ou 60 mg associados com paracetamol ou sem associar. Portanto, são medicamentos de ataque para a dor.

Já os bons também são (+++): loxoprofeno 60 mg (Loxonin ou Oxotron) e tramadol 50 ou 100 mg. Nunca gostei muito do tramadol, pois considero-o inferior à associação de codeína 30 mg e paracetamol 500 mg. Pode ser usados como medicamentos de ataque para a dor.

Insuficientes (++) e (+): meloxicam, tenoxicam, lornoxicam (Xefo 8 mg); nimesulida; etodolaco; celecoxibe e etoricoxibe.

Como já escrevi, se uso celecoxibe, associo com outro medicamento para analgesia mais rápida. O uso de corticoides via oral é lento para o efeito de analgesia, como dexametasona e betametasona em comprimidos. Não os usocomo medicamentos de ataque contra à dor.

Não vejo nenhum motivo para prescrever uma medicação de resgate para todos os pacientes de Endodontia.

 

ASSOCIAÇÕES ENTRE CLASSES DIFERENTES E VIAS DE ADMINSTRAÇÃO DIFERENTES

As associações que pratico são um AINE com um analgésico puro (sem efeito anti-inflamatório). Uso a paracetamol 500 mg como a primeira escolha e o Tylex, para associações com celecoxibe, nimesulida ou qualquer outro dos grupos (++) ou (+). Na literatura[8], sobre a reagudização no pós-operatório:

Flare-up: Igualmente, a sintomatologia clínica pós-operatória pode ser controlada pelo emprego de anestésicos de longa duração, como a bupivacaína, durante a execução dos procedimentos, e pela prescrição de agentes analgésicos/anti-inflamatórios, como o ibuprofeno de 400 a 600 mg, a cada seis horas. Outros agentes, como diclofenaco, naproxeno, cetoprofeno e piroxicam também são bastante eficazes no controle da dor de origem endodôntica. Em casos de dor severa, recomenda-se associar o acetaminofeno de 650 a 1.000 mg no intervalo das doses do ibuprofeno. Para pacientes com intolerância a AINEs que apresentam dor severa, recomenda-se o acetaminofeno de 650-1.000 mg associado a um opioide (60 mg de codeína ou 10 mg de hidrocodona).2 Em consultas posteriores, após a remissão dos sintomas em canais parcialmente instrumentados, a extrusão apical pode causar exacerbação por mobilização de novas células inflamatórias para aquela região. Este flare-up gera frustração ao profissional e, principalmente, ao paciente, que se julgava livre da dor.

A reagudização é uma possibilidade previsível, portanto, sejamos pesados na prescrição de analgésicos. Também podemos associar um fármaco via intramuscular com um fármaco via oral. Por exemplo: uma injeção de 75 mg de diclofenaco via intramuscular, com possível continuação de comprimidos, em casa, para diclofenaco sódico com 50 mg por drágea. Na literatura[9], já previsto:

O regime mais eficaz com os AINEs é o de analgesia preventiva, introduzindo imediatamente após a lesão tecidual, porém antes do início da sensação dolorosa. Em termo práticos, a primeira dose é administrada no final do procedimento (paciente ainda sob os efeitos da anestesia local), seguida das doses de manutenção, por curto período. Os AINEs também são eficazes na dor já instalada (p.ex: pericementites), como complemento dos procedimentos de ordem local (remoção da causa).

A falha no controle da dor leva a problemas como: o tratamento e opinião de outro profissional, automedicação, associação irracional de medicamentos e até processos na Justiça. Portanto, sempre prescreva um comprimido para o paciente, anote no seu prontuário porque o livrará de problemas futuros. Se o paciente levou a receita e não tomou e depois reclamou, isso precisa constar por escrito e será sua defesa em processos indenizatórios oportunistas.

O flare-up frusta o dentista.

CONCLUSÃO

Use sempre o naproxeno, diclofenaco, cetoprofeno ou piroxicam em razão de sua potência analgésica. Na pior das hipóteses, precisará complementar com uma injeção intramuscular de diclofenaco 75 mg ou cetoprofeno 100 mg. Se impossível, a prescrição bem indicada será o Tylex, com fosfato de codeína 30 mg com paracetamol 500 mg. O controle da dor é tarefa do profissional, sem ele, a intervenção de terceiros ou de hábitos nocivos do paciente poderá acabar com sua clientela.

 

 

São Paulo, 16 de fevereiro de 2025

(assinatura digital)



[1] ANDRADE, Terapêutica Medicamentosa em Odontologia, Artes Médicas, São Paulo, 2014, p.3-5.

 

[2] ANDRADE, Terapêutica Medicamentosa em Odontologia, ed. Artes Médicas, 3ª edição, São Paulo, 2019.

[3] ALRAHABIL, Aspects of Clinical Malpractice in Endodontics, Mothanna Alrahabi, Muhammad Sohail Zafar, Nejdet Adanir, 2019.

 

[4] SANTOS, Jadson. Estudo comparativo da analgesia preemptiva do tramadol, combinado a dexametasona e diclofenaco de sódio em cirurgia de terceiro molar, Aracaju, 2011.

[5] MARQUES FILHO, José. Necrose tecidual após injeção de diclofenaco de sódio, Revista Brasileira de Reumatologia, julho/agosto 2003, p.273-274.

[6] MISCH, Implantes Dentais Contemporâneos, Carl E. Misch, 3ª edição, Elsevier, p. 477-480.

[7] Feldene SL (sublingual) talvez seja o analgésico mais rápido. No entanto, tem sido difícil de se encontrar desde 2024.

[8] LOPES e SIQUEIRA, Endodontia – Biologia e técnica, 4ª Edição, Editora Elsevier, 2014, p. 1302.

 

[9] ANDRADE, Terapêutica Medicamentosa em Odontologia, ed. Artes Médicas, 3ª edição, São Paulo, 2019, p. 47.

quarta-feira, 5 de março de 2025

Sobre vinte cursos on-line do Instagram reprovados sobre perícia judicial em Odontologia.

 

Sobre vinte cursos on-line do Instagram reprovados sobre perícia judicial em Odontologia.

 

André Eduardo Amaral Ribeiro, dentista perito no TJ-SP, com 275 nomeações até hoje.

Sempre se fala em renda extra nas redes sociais. E estão certos. A perícia tem sido oferecida como uma renda extra como propaganda de muitos cursos on-line mal intencionados, com instrutores ou professores que nunca foram nomeados para ser peritos, ou seja, são grandes fraudes. Essa indústria dos infoprodutos é perigosa, com altas taxas de insatisfação porque seus produtos escritos são superficiais, as apostilas e modelos de laudos.

Sempre espiono estes sites de cursinhos de perícia judicial e ajudo muitos dentistas a fugirem deles para não jogar dinheiro fora.

Encontrei estes textos depois de uma aluna me perguntar se eu conhecia o curso que pretendia fazer. Não conhecia a autora, mas espionei o site e descobri que a instrutora era uma bibliotecária. Exatamente, uma bibliotecária ensinando a um dentista a escrever um laudo.

Obviamente, a bibliotecária nunca poderia ter sido nomeada para uma perícia na Justiça Cível, por falta de diploma em Odontologia. Visitei o site dela, mal redigido e cheio de generalidades. O texto não me disse nada. Trouxe um trecho para que o aluno entendo a diferença entre conteúdo de qualidade e um conteúdo genérico, as palavras em itálico são minhas:

Desafios e Dificuldades da Profissão: A profissão de dentista perito judicial é uma atividade que requer muita responsabilidade e habilidade técnica, contudo, assim como em qualquer outra profissão, existem desafios e dificuldades que precisam ser enfrentados. Desafios: Um dos principais desafios da profissão de dentista perito judicial é lidar com a complexidade dos casos, tendo em vista que muitos casos envolvem questões técnicas e científicas que exigem um conhecimento aprofundado da área. Além disso, é preciso ter uma visão crítica e imparcial para avaliar as evidências e tomar decisões justas e equilibradas. Outro desafio é a pressão do tempo, já que os prazos para a realização dos laudos e pareceres são muitas vezes curtos, o que exige uma boa organização e planejamento para entregar um trabalho de qualidade dentro do prazo estabelecido. Dificuldades: Quanto às dificuldades enfrentadas pelos dentistas peritos judiciais, a principal é a falta de reconhecimento da profissão. Muitas vezes, os profissionais são vistos como meros prestadores de serviço, sem a devida valorização e respeito pela sua expertise. Além disso, a falta de padronização dos procedimentos e metodologias utilizadas pelos dentistas peritos judiciais pode gerar divergências e conflitos entre os profissionais. Portanto, é fundamental que haja uma uniformização dos critérios e procedimentos para garantir a qualidade e a confiabilidade dos laudos e pareceres. Outra dificuldade é a necessidade de atualização constante, sobretudo porque a área da odontologia está em contínua evolução, com novas técnicas e tecnologias surgindo a todo momento. Sendo assim, os dentistas peritos judiciais devem se manter sempre atualizados e capacitados para lidar com as demandas da profissão.

Os termos indefinidos já indicaram que a autora nada sabia sobre o que escreveu. Note o “muita responsabilidade” como é uma frase inespecífica. Se o aluno for nomeado e não souber o que está escrevendo, poderá apresentar uma falsa conclusão, o que é um crime (art. 342, Código Penal). Então entenda: você não pode fazer um curso vagabundo, se inscrever no site do Tribunal do seu Estado, comprar um certificado digital e aguardar as nomeações. Não vai entender os termos jurídicos, não vai conhecer a sequência processual. Será um vexame logo na sua primeira nomeação.

A fase pericial sempre está contida fase de instrução do processo, antes da fase decisória (sentença judicial). Para se manifestar nos autos, você precisa conhecer o andamento e sequência de passos dentro do processo, precisa já ter lido uns vinte processos antes. Então, a primeira dica verdadeira será ler outros processos.

Um autor preciso enumera as etapas de uma perícia cível em Odontologia: decisão pela prova pericial, nomeação de um perito, pedido de honorários, depósito judicial, agendamento da data do exame, exame pericial com a presença do paciente-autor e assistentes técnicos. Depois: redação do laudo, juntada aos autos, fase de esclarecimentos, impugnações e homologação ou recusa do laudo. Outra ordem pode existir em casos de segunda perícia, por insuficiência da primeira perícia ou por anulação do laudo pericial anterior. E isso não é para novatos. Se receber uma nomeação para corrigir outra perícia, não aceita. Isso é difícil porque exige experiência.

Depois temos a “complexidade de casos”. Aqui me pareceu que a autora se referiu às especialidades – o que todos pensam que é preciso ser especialista na área de Odontologia – isso não é verdade. As perícias são multidisciplinares, a maioria das provas hoje em dia vêm por meio de radiografias e tomografias. Se o advogado do paciente pedir um especialista em Implantodontia, você pode responder que a perícia é multidisciplinar, que as provas técnicas principais serão exames de imagem (tomo e panorâmicas). Já afaste esse papo de advogado que não quer pagar, mas quer exigir um especialista.

A “pressão do tempo” já me mostrou que a autora desse blog não tinha qualquer conhecimento de perícias judiciais. O perito experiente enfrenta o excesso de tempo, a demora do fórum para impulsionar o processo. O oposto é a verdade forense porque tudo demora. Às vezes, a petição do perito pode levar três meses para ser lida. Aconteceu comigo, numa nomeação que recebi em Barueri. A autora (paciente) faltou à perícia, algumas horas depois do horário marcado para o exame, escrevi três parágrafos. Era uma folha. Foi protocolada em julho e lida em outubro, com um despacho: Intime-se o perito a reagendar a perícia. O juiz não pediu nenhuma comprovação da autora, que alegou ter sentido um mal súbito. Ele não exigiu um atestado médico e mandou que eu marcasse nova data, o que me faz pagar pelo aluguel de um consultório naquela tarde. Nunca recebi nenhuma compensação financeira, mas aprendi. Segunda dica verdadeira: nunca agende uma perícia por dia. A não ser que você não pague pelo espaço. No caso da maioria dos peritos iniciantes, que precisam de renda extra, pense sempre na possibilidade da falta do cliente e do descaso de um juiz ou outro. A falta da parte é uma desvantagem da carreira de perito, mas com o tempo você aprenderá a lidar com isso.

Então tivemos uma frase “Portanto, é fundamental que haja uma uniformização dos critérios e procedimentos para garantir a qualidade e a confiabilidade dos laudos e pareceres”. Quais são os critérios? Quais são os procedimentos? Já notou que tudo é genérico nessa apresentação de curso on-line.

Se eu quiser escrever sobre os critérios para avaliação da qualidade de um laudo pericial, eu diria de modo concreto:

Língua portuguesa: excesso de frases em ordem indireta, excesso de voz passiva e juridiquês. Exemplos:

 

A petição foi indeferida pelo juiz (ordem indireta). Escreva na ordem direta: O juiz indeferiu a petição.

 

Os quesitos não foram respondidos pelo perito (voz passiva). Escreva na voz ativa: O perito não respondeu aos quesitos.

 

Com clareza solar, a requerida não cumpriu as obrigações dela (juridiquês). Não use. Escreva simplesmente que a requerida não cumpriu suas obrigações e especifique quais foram as obrigações: A requerida não cumpriu as obrigações para entregar o implante e a coroa unitária.

 

Existe um livro ótimo sobre o tema. Aliás, o único do qual você aprenderá sobre redação jurídica, do Professor Antônio Gidi. Nascido na Bahia, ele leciona nos Estados Unidos, onde há preocupação séria no combate ao juridiquês, como ele explica no começo de seu livro, Redação Jurídica Profissional.

 

Falta de fundamentação: sempre junte alguma literatura aos seus laudos. Nunca escreva com a voz dentro de sua cabeça. Exemplo:

E por último, evitar o texto prolixo em respeito ao tempo do leitor[1] : “Se o texto é repetitivo, a tarefa de ler passa a ser difícil, cansativa, enfadonha. O leitor pode se irritar e abandonar a leitura, ou pular algumas partes e não entender bem o texto”. Afinal na conclusão de Antônio Gidi[2] : o leitor ocupado não vai reler a mesma ideia várias vezes sem se aborrecer.

 

Isso é qualidade num texto pericial, com fontes literárias. Um laudo dever ter suas referências no rodapé sempre. Um exemplo retirado da literatura odontológica:

 

Quesito 2 - Diga o Perito, quais foram os exames solicitados pela Requerida para sugerir e iniciar o tratamento? Os exames solicitados foram suficientes? Era necessário/recomendável a prescrição de exames complementares? A não solicitação de exames complementares como dito anteriormente influenciou no insucesso do tratamento?

Foram insuficientes. A literatura[3] é clara sobre a segurança da avaliação do paciente na fase pré-operatória.

Das áreas edêntulas faz-se necessário o pedido de tomografias, pois só assim a(o) profissional pode ter uma visão tridimensional da região a ser operada, bem como medidas reais do volume ósseo disponível. Em algumas situações, é possível pedir protótipos associados as tomografias para auxiliar no planejamento do caso. 

Use sempre uma fonte menor e um recuo maior para transcrever citações com mais de três linhas, como no caso acima. Isso gera um aspecto estético ao texto. Quando puder, leio algum livro sobre tipografia.

Confiabilidade: o termo foi inespecífico. O laudo terá um dos dois valores lógicos dentro do processo: será homologado ou será recusado. Ter um laudo recusado é grave. O perito novato nunca mais será chamado naquela vara ou por aquele juiz. Então, não se aventure. Saiba o que está fazendo. Esses cursinhos do Instagram não contam as enrascadas que o novato pode se meter. Não contam por que o instrutor do curso nunca fez uma perícia odontológica.

Depois, a autora do blog escreveu “atualização constante”. Isso é falso.

A justiça cível é lenta nas mudanças e um laudo em Odontologia não exige conhecimentos de tecnologia, biomateriais ultra avançados ou participação nos últimos congressos. Uma vez ouvi de um assistente técnico já experiente que me disse me meus laudos eram inválidos porque eu usava referências de livros, no caso ele se referiu ao Caminhos da Polpa, Cohen. Na opinião dele, eu deveria segui-lo e responder aos quesitos usando literatura científica, apenas escrever sobre o mais moderno.

No caso, um tratamento endodôntico realizado numa clínica popular, com sub-obturação. Não acredito nesse tipo de colocação, foi apenas um modo de se justificar para o dentista que o contratou para justificar seu “copia e cola” na produção dos quesitos. Se quiser citar algum texto científico, junte-o integralmente ao laudo, mesmo que seja em inglês. E cuidado para não entrar por um caminho da ultra tecnologia quando está lidando com um caso de uma clínica popular que custou R$ 1.200,00. São realidades diferentes. Então, foque-se na realidade do processo cível que está na sua frente, não em congressos em Estocolmo ou Viena.

Dicas verdadeira para o perito iniciante

Quando quiser iniciar-se na carreira da perícia judicial, não improvise. Comece com  a meta de aprender a procurar processos cíveis no site do tribunal de Justiça do seu estado. Normalmente, duas opções existem para procurá-los: banco de sentenças ou jurisprudência.

Digite algum termo odontológico, como: implantes dentários, tratamento endodôntico, ortodontia. Procure alguns processos, baixe em PDF e arquive-os numa pasta no seu computador.

Leia cerca de vinte deles, se achar insuportável e chato, tenha a certeza de que você não poderá ser um perito judicial na área. A perícia exige muita leitura, que ficará mais rápida e seletiva na prática.

Depois de alguma familiarização como processos, você reconhecerá folhas que se repetirão dentro do processo, como certidões de publicação. Quando estiver lendo e vir uma dessas, pule imediatamente. Afirmo que cerca de 20% de um processo será o que usará para começar o seu laudo.

O segundo passo é aprender sobre responsabilidade civil do dentista. Mas ficará para depois.

Se gostar do que leu, entre em contato comigo.

andreamaralribeiro@hotmail.com

 

São Paulo, 26 de outubro de 2024

 

 



[1] SCHOPENHAUER, Arthur, On Style, edição de Lane Cooper, p. 232, 1952.

[2] GIDI, Redação Jurídica, Editora Podivm, Salvador, 2024, p. 67

[3] Guia para o Implantodontista, CROSP, p. 7/15 

Apresentação de honorários periciais no Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a suposta obrigação da planilha

 

Apresentação de honorários periciais no Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a suposta obrigação da planilha[1].

 

Nada pior que os pseudomentores na área das periciais judiciais. Aquele que nunca foi nomeado por nenhum juiz de direito, mas considera-se autoridade no assunto. Lembre-se: cada nomeação já foi publicada no Diário de Justiça Eletrônico e qualquer pessoa pode verificar a veracidade da nomeação. É a indústria dos infoprodutos malfeitos.

 

 

 

 

 

A planilha de horas não é obrigatória. Ela está em desuso, pois abusaram tanto dela com a inflação das horas que o modelo se esgotou.

As respostas para as dúvidas devem ser escritas e assinadas, para que o aluno sinta segurança na resposta. Mas os pseudomentores da internet (as pseudomentores também) fogem de escrever, eles preferem filmar, dá menos trabalho e fica mais fácil ser prolixo: ou encher linguiça, como dizem no sul do Brasil. Vídeos com vinte e cinco minutos de duração no YouTube sobre como apresentar a planilha de honorários não acrescentam ao aluno e sempre o vídeo termina com uma venda de um infoproduto malfeito, escrito por alguém que nunca foi nomeado numa Vara Cível (ou escrito por inteligência artificial). Se quiser meter-se em confusão, pergunte às falsas mentoras quantas vezes elas já foram nomeadas e se eles têm o número de cada processo e de qual Tribunal a nomeação partiu. Verifique no mecanismo de busca do Diário de Justiça e confirme a informação. Nada será encontrado com o nome da pseudoperita, provavelmente. Notem que gosto do prefixo grego pseudo.

Pessoas na frente de um prédio

Descrição gerada automaticamente

 

Alguns novatos em perícia judicial me perguntaram sobre a perícia criminal. O Estado já tem esse mecanismo por meio da Polícia Civil. Ela é responsável por investigações de crimes. Então, se você vir algum curso ou mentoria tentando te vender teoria para entrar no mundo da perícia criminal, fuja, pois, uma fraude para levar seu dinheiro. O único caminho para a perícia criminal é o concurso público para Perito Criminal. Em São Paulo na Polícia Civil, na qual a escola fica dentro da Cidade Universitária, no Butantã, Academia de Polícia Dr. Coriolano Nogueira. Se tiver interesse na perícia criminal, procure um cursinho sério, aqueles geralmente ministrados por professores que foram delegados de polícia.

Os peritos criminais recebem salários fixos. Não existem comissões ou qualquer tipo de extra por cada inquérito concluído.

Talvez esses pseudomentores diga mais mentiras num vídeo do YouTube: que existe a função de assistente de acusação ou assistente técnico. Isso existe de fato, mas é muito raro que alguém te pague para trabalhar nisso. A ação penal é movida pelas Promotorias de Justiça, do Ministério Público Estadual ou Federal. Poucas ações criminais têm a iniciativa privada, as mais comuns são naqueles crimes contra a honra: calúnia, injúria e difamação. Improvável que alguém pague por um serviço de assistente de acusação nesses casos. Nesses casos, a pessoa ofendida geralmente quer sigilo e não vai lhe permitir que um desconhecido acesse fotos íntimas que acabaram na internet, por exemplo. Então, cuidado com os truques dos infoprodutos na internet.

Existe uma alternativa concreta:  concentre-se na perícia cível, portanto. Procure as ações indenizatórias. Talvez você já tenha ouvido falar na indústria do dano moral ou na indústria de indenização. Pois é a demanda real e onde você deve procurar a para entrar na realidade dos peritos judiciais que faturam algum dinheiro. Procure no Google sobre a indústria do dano moral, pois você encontrará textos das OABs sobre milhares de processos parados, com pedidos de indenização e seguidos de muitas críticas ao Poder Judiciário.

A suposta obrigação de uma planilha de honorários periciais não é complicada como os pseudomentores afirmam no YouTube. Existem duas situações: se você já é famoso; ou, se você está começando, pois não teve nenhuma nomeação ainda.

 

SE VOCÊ JÁ É FAMOSO NO PODER JUDICIÁRIO

Nunca se esqueça de somar e anotar todas os números dos processos nos quais foi nomeado, arquive no Word ou Excel. Você poderá enumerar numa lista com o número de nomeações que já recebeu (com o número de cada processo). Isso faz com que a informação seja comprovável para o juiz de direito. Nestes casos, sua apresentação de honorários pode ser escrita por meio de apenas um parágrafo. Pessoalmente, uso o número prévio de nomeações para cobrar um valor mais alto, exemplo:

Em razão da experiência acumulada em 275 nomeações, proponho R$ 11.000,00 como honorários provisórios.

Vou comprovar. Note este exemplo de um processo no qual trabalhei em 2021. Veja que ele é verdadeiro porque a assinatura digital está na margem direita (seta amarela). Naquela época, eu somava 174 nomeações, então usei essa informação para justificar meu preço, sem precisar usar uma planilha artificial de horas.

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo, Email

Descrição gerada automaticamente

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

E isso basta. Na pior das hipóteses, o juiz vai arbitrar um valor menor daquele que você pediu, contra o qual você não vai discutir. Vai aceitar e vai escrever seu laudo.

 

SE VOCÊ AINDA NÃO É FAMOSO NO PODER JUDICIÁRIO

Você deve ser concreto para aumentar o valor que você pretende cobrar. Entenda isso.

Caixa de Texto: Duas horas – leitura dos autos
Quatro horas – ida até a biblioteca da faculdade para levantamento bibliográfico
Quatro horas – realização da perícia em si
Uma hora – organização e edição das fotos periciais
Oito horas – resposta aos quesitos
Quatro horas – revisão do laudo
Total: 23 horas, com o custo de R$ 300,00 por hora, R$ 6.900,00.

As planilhas com horas, ficções como “ida até a biblioteca”, “doze horas para a resposta aos quesitos” são ridículas porque são artificiais. Não escreva essas mentiras, que vão depor contra você. Ninguém vai até a biblioteca hoje em dia para pesquisar. Exemplo de uma planilha artificial:

 

Tais planilhas que os pseudomentores vendem são infoprodutos, que querem te  vender desesperadamente. Não funcionam na prática e até desacreditam o novato diante dos juízes. A dica concreta é: você vai ler os autos e sua primeira ação será enumerar as provas.

Portanto, dê um número para cada prova já na petição inicial. Nisso você já mostrou ao Juiz que está trabalhando no processo (antes mesmo de ter aceitado) e nada melhor do que trabalho concreto para poder justificar seus honorários.

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

Evite frases como: as partes deverão apresentar todas as provas que consideraram elucidativas para o caso, seja concreto, dê nome, datas e números a cada uma das provas – exames de sangue, radiografias, tomografias. Evite os pronomes indefinidos em suas petições como: muitos, vários, alguns, diversos. Use números propriamente ditos.

Quando quiser referenciar a alguma prova, use o número e talvez um recurso tipográfico, como o grifo cinza, exemplo:

Então, o implante dentário se mostrou satisfatório, conforme a radiografia (PROVA 8).

Note que não haveria como ser mais concreto do que a frase acima. Ela foi escrita na ordem direta – sujeito (implante dentário), verbo (mostrar), complemento (satisfatório) e um advérbio de lugar (radiografia) e ainda você numerou a prova.

Outro fator para valorizar seu pedido de honorários é montar uma cronologia dos fatos no processo, veja como é simples e concreto:

Tela de celular com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

Quanto mais concreto, maior confiança você passará ao juiz, que ainda não o conhece. Sugiro que não ultrapasse os R$ 3.000,00 no começo da carreira. Quando somar umas vinte nomeações, você poderá pedir um pouquinho mais, quatro ou cinco mil reais.

 

COMO FUNCIONAM AS NOMEAÇÕES NA JUSTIÇA CÍVEL

Existem três formas: por sorteio, por indicação e por fama. Os Tribunais têm um cadastro dos peritos de cada área. Se um juiz quer nomear alguém na área de Geologia, mas não conhece nenhum perito na área, ou ele sorteará ou perguntará a algum outro juiz se conhece alguém para a tarefa pericial. Portanto, temos as alternativas para receber as nomeações:

(a)   Por sorteio: quando nunca se teve uma nomeação antes, resta esperar ser sorteado. Alguns levam até três anos para ganhar a oportunidade.

(b)   Por indicação: não depende de você. Normalmente, os juízes que trabalham no mesmo fórum participam grupos de WhatsApp. Quando precisam, eles conversam entre eles.

(c)   Por fama: quando já foi nomeado muitas vezes, com um trabalho honesto, com um bom português, as nomeações surgirão.

 

Logo, se você é um novato, cadastre-se e espere. Viva normalmente, olhe sua caixa de e-mails diariamente e não cometa o erro de tentar acelerar as nomeações por meio de visitas aos gabinetes. Essa é outra mentira que os pseudomentores contam – dizem para visitar, para que você use um terno, uma gravata, imprima seu currículo e visite todos os juízes do fórum da sua cidade.

Primeiro, verá que é muito chato. Os assistentes jurídicos vão te esnobar, deixar esperando no gabinete, e se o juiz te atender, raramente te dará atenção. Segundo, você não terá nada a dizer, afinal, você nunca foi nomeado...

Talvez essa lenda de visitar os gabinetes tenha funcionado no passado, quando não existiam portais de cadastro de auxiliares de Justiça; ou quando os currículos eram impressos em papel. Quando eu comecei em 2013, os chefes dos cartórios cíveis tinham pastas arquivadas, cheias de currículos de peritos. Isso já acabou, apesar de muitos pseudomentoreses continuarem a propagar essa história nas redes sociais. Tudo foi digitalizado.

Lembro que por volta de 2014, ainda existia essa moda de levar currículos. Fiz isso no fórum de Pinheiros, em São Paulo. Pedi para falar com a chefe do cartório e chamaram uma mulher alta e mau humorada. Quando ela ouviu que eu era um “perito”, respondeu: “não estamos pegando currículos agora, já temos muitos”. Foi humilhante.

 

DICAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Essa é dica mais importante de redação jurídica - escreva sempre com ordem direta, ou ordem canônica. Evite frases indiretas como: mostrou-se satisfatório o implante dentário; estava satisfatório o implante dentário; insatisfatório estava o implante dentário. Grande volume de textos nos processos judiciais usa a ordem indireta, para parecer mais culta. Tenha a ordem direta como primeira regra para seu laudo. Na gramática:

Posição do sujeito na oração

Normalmente, o sujeito antecede o predicado; todavia, a posposição do sujeito ao verbo é fato corriqueiro em nossa língua. Exemplos:

É facílimo esse problema!

Vão-se os anéis, fiquem os dedos.

“Breve desaparecem os dois guerreiros entre as árvores.” (José de Alencar)

“Foi ouvida por Deus a súplica do condenado.” (Ramalho Ortigão)

“No muro de tijolo vermelho passeavam lagartixas.” (Graciliano Ramos)

Veja esta aula que foi disponibilizada pela Escola Superior do Ministério Público em 2018. Participei desse curso excelente, paguei R$ 100,00 em 2018. Recebi um certificado assinado pelo ministrador, um professor de Linguística da Unesp.

Sobre o juridiquês:

A procura por uma linguagem rebuscada e perfeita, associada à precisão de sentido, induz o jurista à formação de sentenças truncadas, evasivas, que podem levar à falsa interpretação. Nesse caso, forma-se um abismo linguístico, em que de um lado se encontra o profissional forense e do outro a população em geral. A linguagem permanece no centro, obscura e imperfeita aos olhos da concisão (FRÖHLICH, 2015, p. 215).

 

Diagrama, Texto

Descrição gerada automaticamente

E ainda, na obra que o curso do MP usou como referência:

Interface gráfica do usuário

Descrição gerada automaticamente

Como enfatizam Moreno e Martins (2011), sendo “petição inicial” uma expressão técnica, não há muito há acrescentar. Petição inicial é petição inicial. Assim, as expressões acima para “substituir” petição inicial saem, no entender de Fröhlich (2015), da esfera de meros sinônimos e entram na esfera prolixa do discurso escrito. Logo, um bom texto no campo jurídico deve ater-se as palavras e expressões técnicas, sem sombra do juridiquês.

Por enquanto, concentre-se em escrever com o sujeito antes do predicado que já estará se diferenciando da manada de aspirantes a perito judicial que as redes sociais estão tentando fabricar artificialmente.

Escreverei mais dicas depois.

São Paulo, 30 de outubro de 2024



 André Eduardo Amaral Ribeiro, perito com 275 nomeações em Odontologia, em outubro de 2024, andreamaralribeiro@hotmail.com

 

 CEGALLA, Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 2010.

 MORENO, Cláudio e MARTINS, Túlio. Português para convencer: comunicação e persuasão em Direito. 2.ed. São Paulo.

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