Apresentação de honorários periciais no Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a suposta obrigação da planilha[1].
Nada pior
que os pseudomentores na área das periciais judiciais. Aquele que nunca foi
nomeado por nenhum juiz de direito, mas considera-se autoridade no assunto.
Lembre-se: cada nomeação já foi publicada no Diário de Justiça Eletrônico e
qualquer pessoa pode verificar a veracidade da nomeação. É a indústria dos infoprodutos
malfeitos.
A planilha de horas não é obrigatória. Ela está em desuso, pois
abusaram tanto dela com a inflação das horas que o modelo se esgotou.
As respostas para as dúvidas devem ser escritas e assinadas, para que o
aluno sinta segurança na resposta. Mas os pseudomentores da internet (as
pseudomentores também) fogem de escrever, eles preferem filmar, dá menos
trabalho e fica mais fácil ser prolixo: ou encher linguiça, como dizem
no sul do Brasil. Vídeos com vinte e cinco minutos de duração no YouTube sobre
como apresentar a planilha de honorários não acrescentam ao aluno e sempre o
vídeo termina com uma venda de um infoproduto malfeito, escrito por alguém que
nunca foi nomeado numa Vara Cível (ou escrito por inteligência artificial). Se
quiser meter-se em confusão, pergunte às falsas mentoras quantas vezes elas
já foram nomeadas e se eles têm o número de cada processo e de qual
Tribunal a nomeação partiu. Verifique no mecanismo de busca do Diário de
Justiça e confirme a informação. Nada será encontrado com o nome da pseudoperita,
provavelmente. Notem que gosto do prefixo grego pseudo.
Alguns novatos em perícia judicial me perguntaram sobre a perícia
criminal. O Estado já tem esse mecanismo por meio da Polícia Civil. Ela é
responsável por investigações de crimes. Então, se você vir algum curso ou
mentoria tentando te vender teoria para entrar no mundo da perícia criminal, fuja,
pois, uma fraude para levar seu dinheiro. O único caminho para a perícia
criminal é o concurso público para Perito Criminal. Em São Paulo na Polícia
Civil, na qual a escola fica dentro da Cidade Universitária, no Butantã, Academia
de Polícia Dr. Coriolano Nogueira. Se tiver interesse na perícia criminal,
procure um cursinho sério, aqueles geralmente ministrados por professores que
foram delegados de polícia.
Os peritos criminais recebem salários fixos. Não existem comissões ou qualquer
tipo de extra por cada inquérito concluído.
Talvez esses pseudomentores diga mais mentiras num vídeo do YouTube:
que existe a função de assistente de acusação ou assistente técnico. Isso
existe de fato, mas é muito raro que alguém te pague para trabalhar nisso. A
ação penal é movida pelas Promotorias de Justiça, do Ministério Público
Estadual ou Federal. Poucas ações criminais têm a iniciativa privada, as mais
comuns são naqueles crimes contra a honra: calúnia, injúria e difamação. Improvável
que alguém pague por um serviço de assistente de acusação nesses casos. Nesses
casos, a pessoa ofendida geralmente quer sigilo e não vai lhe permitir que um
desconhecido acesse fotos íntimas que acabaram na internet, por exemplo. Então,
cuidado com os truques dos infoprodutos na internet.
Existe uma alternativa concreta: concentre-se na perícia cível, portanto.
Procure as ações indenizatórias. Talvez você já tenha ouvido falar na indústria
do dano moral ou na indústria de indenização. Pois é a demanda real e onde você
deve procurar a para entrar na realidade dos peritos judiciais que faturam
algum dinheiro. Procure no Google sobre a indústria do dano moral, pois
você encontrará textos das OABs sobre milhares de processos parados, com
pedidos de indenização e seguidos de muitas críticas ao Poder Judiciário.
A suposta obrigação de uma planilha de honorários periciais não é
complicada como os pseudomentores afirmam no YouTube. Existem duas situações: se
você já é famoso; ou, se você está começando, pois não teve nenhuma nomeação ainda.
SE VOCÊ JÁ É FAMOSO NO PODER
JUDICIÁRIO
Nunca se esqueça de somar e anotar todas os números dos processos nos
quais foi nomeado, arquive no Word ou Excel. Você poderá enumerar numa lista
com o número de nomeações que já recebeu (com o número de cada processo).
Isso faz com que a informação seja comprovável para o juiz de direito. Nestes
casos, sua apresentação de honorários pode ser escrita por meio de apenas um
parágrafo. Pessoalmente, uso o número prévio de nomeações para cobrar um valor
mais alto, exemplo:
Em razão da experiência
acumulada em 275 nomeações, proponho R$ 11.000,00 como honorários provisórios.
Vou
comprovar. Note este exemplo de um processo no qual trabalhei em 2021. Veja que
ele é verdadeiro porque a assinatura digital está na margem direita (seta
amarela). Naquela época, eu somava 174 nomeações, então usei essa informação
para justificar meu preço, sem precisar usar uma planilha artificial de horas.
E isso basta. Na pior das hipóteses, o juiz vai arbitrar um valor menor
daquele que você pediu, contra o qual você não vai discutir. Vai aceitar e vai
escrever seu laudo.
SE VOCÊ AINDA NÃO É FAMOSO NO
PODER JUDICIÁRIO
Você deve ser concreto para aumentar o valor que você pretende cobrar.
Entenda isso.
As planilhas com horas, ficções como “ida até a biblioteca”, “doze
horas para a resposta aos quesitos” são ridículas porque são artificiais.
Não escreva essas mentiras, que vão depor contra você. Ninguém vai até a
biblioteca hoje em dia para pesquisar. Exemplo de uma planilha artificial:
Tais planilhas que os pseudomentores vendem são infoprodutos, que querem
te vender desesperadamente. Não
funcionam na prática e até desacreditam o novato diante dos juízes. A dica
concreta é: você vai ler os autos e sua primeira ação será enumerar as
provas.
Portanto, dê um número para cada prova já na petição inicial. Nisso
você já mostrou ao Juiz que está trabalhando no processo (antes mesmo de ter
aceitado) e nada melhor do que trabalho concreto para poder justificar seus
honorários.
Evite frases como: as partes deverão apresentar todas as provas que
consideraram elucidativas para o caso, seja concreto, dê nome, datas e
números a cada uma das provas – exames de sangue, radiografias, tomografias. Evite
os pronomes indefinidos em suas petições como: muitos, vários, alguns,
diversos. Use números propriamente ditos.
Quando quiser referenciar a alguma prova, use o número e talvez um recurso
tipográfico, como o grifo cinza, exemplo:
Então, o implante dentário se
mostrou satisfatório, conforme a radiografia (PROVA 8).
Note que não
haveria como ser mais concreto do que a frase acima. Ela foi escrita na ordem
direta – sujeito (implante dentário), verbo (mostrar), complemento
(satisfatório) e um advérbio de lugar (radiografia) e ainda você numerou a
prova.
Outro
fator para valorizar seu pedido de honorários é montar uma cronologia dos fatos
no processo, veja como é simples e concreto:
Quanto
mais concreto, maior confiança você passará ao juiz, que ainda não o conhece.
Sugiro que não ultrapasse os R$ 3.000,00 no começo da carreira. Quando somar
umas vinte nomeações, você poderá pedir um pouquinho mais, quatro ou cinco mil
reais.
COMO FUNCIONAM AS NOMEAÇÕES NA JUSTIÇA CÍVEL
Existem três
formas: por sorteio, por indicação e por fama. Os Tribunais têm um cadastro dos
peritos de cada área. Se um juiz quer nomear alguém na área de Geologia, mas
não conhece nenhum perito na área, ou ele sorteará ou perguntará a algum outro
juiz se conhece alguém para a tarefa pericial. Portanto, temos as alternativas
para receber as nomeações:
(a) Por sorteio: quando nunca se teve uma nomeação antes,
resta esperar ser sorteado. Alguns levam até três anos para ganhar a
oportunidade.
(b) Por indicação: não depende de você. Normalmente, os
juízes que trabalham no mesmo fórum participam grupos de WhatsApp. Quando
precisam, eles conversam entre eles.
(c) Por fama: quando já foi nomeado muitas vezes, com um
trabalho honesto, com um bom português, as nomeações surgirão.
Logo, se você é um novato, cadastre-se e
espere. Viva normalmente, olhe sua caixa de e-mails diariamente e não cometa
o erro de tentar acelerar as nomeações por meio de visitas aos gabinetes.
Essa é outra mentira que os pseudomentores contam – dizem para visitar, para
que você use um terno, uma gravata, imprima seu currículo e visite todos os
juízes do fórum da sua cidade.
Primeiro, verá que é muito chato. Os
assistentes jurídicos vão te esnobar, deixar esperando no gabinete, e se o juiz
te atender, raramente te dará atenção. Segundo, você não terá nada a dizer,
afinal, você nunca foi nomeado...
Talvez essa lenda de visitar os
gabinetes tenha funcionado no passado, quando não existiam portais de cadastro
de auxiliares de Justiça; ou quando os currículos eram impressos em papel.
Quando eu comecei em 2013, os chefes dos cartórios cíveis tinham pastas
arquivadas, cheias de currículos de peritos. Isso já acabou, apesar de muitos pseudomentoreses
continuarem a propagar essa história nas redes sociais. Tudo foi digitalizado.
Lembro que por volta de 2014, ainda
existia essa moda de levar currículos. Fiz isso no fórum de Pinheiros, em São
Paulo. Pedi para falar com a chefe do cartório e chamaram uma mulher alta e mau
humorada. Quando ela ouviu que eu era um “perito”, respondeu: “não estamos
pegando currículos agora, já temos muitos”. Foi humilhante.
DICAS DE LÍNGUA PORTUGUESA
Essa é
dica mais importante de redação jurídica - escreva sempre com ordem direta, ou
ordem canônica. Evite frases indiretas como: mostrou-se satisfatório o implante
dentário; estava satisfatório o implante dentário; insatisfatório estava o
implante dentário. Grande volume de textos nos processos judiciais usa a
ordem indireta, para parecer mais culta. Tenha a ordem direta como primeira
regra para seu laudo. Na gramática[2]:
Posição do sujeito na oração
Normalmente, o sujeito antecede o predicado;
todavia, a posposição do sujeito ao verbo é fato corriqueiro em nossa língua.
Exemplos:
É facílimo esse problema!
Vão-se os anéis, fiquem os dedos.
“Breve desaparecem os dois guerreiros entre as
árvores.” (José de Alencar)
“Foi ouvida por Deus a súplica do condenado.”
(Ramalho Ortigão)
“No muro de tijolo vermelho passeavam
lagartixas.” (Graciliano Ramos)
Veja esta
aula que foi disponibilizada pela Escola Superior do Ministério Público em 2018.
Participei desse curso excelente, paguei R$ 100,00 em 2018. Recebi um
certificado assinado pelo ministrador, um professor de Linguística da Unesp.
Sobre o
juridiquês:
A procura por uma linguagem rebuscada e
perfeita, associada à precisão de sentido, induz o jurista à formação de
sentenças truncadas, evasivas, que podem levar à falsa interpretação. Nesse
caso, forma-se um abismo linguístico, em que de um lado se encontra o
profissional forense e do outro a população em geral. A linguagem permanece no
centro, obscura e imperfeita aos olhos da concisão (FRÖHLICH, 2015, p. 215).
E ainda, na
obra[3]
que o curso do MP usou como referência:
Como enfatizam Moreno e Martins (2011), sendo
“petição inicial” uma expressão técnica, não há muito há acrescentar. Petição
inicial é petição inicial. Assim, as expressões acima para “substituir” petição
inicial saem, no entender de Fröhlich (2015), da esfera de meros sinônimos e
entram na esfera prolixa do discurso escrito. Logo, um bom texto no campo
jurídico deve ater-se as palavras e expressões técnicas, sem sombra do
juridiquês.
Por
enquanto, concentre-se em escrever com o sujeito antes do predicado que já
estará se diferenciando da manada de aspirantes a perito judicial que as redes
sociais estão tentando fabricar artificialmente.
Escreverei
mais dicas depois.
São Paulo,
30 de outubro de 2024
[1] André
Eduardo Amaral Ribeiro, perito com 275 nomeações em Odontologia, em outubro de
2024, andreamaralribeiro@hotmail.com
[2] CEGALLA,
Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, Companhia Editora Nacional, São
Paulo, 2010.
[3] MORENO,
Cláudio e MARTINS, Túlio. Português para convencer: comunicação e persuasão em
Direito. 2.ed. São Paulo.
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