sábado, 2 de novembro de 2024

Apresentação de honorários periciais no Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a suposta obrigação da planilha

 

Apresentação de honorários periciais no Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a suposta obrigação da planilha[1].

 

Nada pior que os pseudomentores na área das periciais judiciais. Aquele que nunca foi nomeado por nenhum juiz de direito, mas considera-se autoridade no assunto. Lembre-se: cada nomeação já foi publicada no Diário de Justiça Eletrônico e qualquer pessoa pode verificar a veracidade da nomeação. É a indústria dos infoprodutos malfeitos.

 

 

 

 

 

A planilha de horas não é obrigatória. Ela está em desuso, pois abusaram tanto dela com a inflação das horas que o modelo se esgotou.

As respostas para as dúvidas devem ser escritas e assinadas, para que o aluno sinta segurança na resposta. Mas os pseudomentores da internet (as pseudomentores também) fogem de escrever, eles preferem filmar, dá menos trabalho e fica mais fácil ser prolixo: ou encher linguiça, como dizem no sul do Brasil. Vídeos com vinte e cinco minutos de duração no YouTube sobre como apresentar a planilha de honorários não acrescentam ao aluno e sempre o vídeo termina com uma venda de um infoproduto malfeito, escrito por alguém que nunca foi nomeado numa Vara Cível (ou escrito por inteligência artificial). Se quiser meter-se em confusão, pergunte às falsas mentoras quantas vezes elas já foram nomeadas e se eles têm o número de cada processo e de qual Tribunal a nomeação partiu. Verifique no mecanismo de busca do Diário de Justiça e confirme a informação. Nada será encontrado com o nome da pseudoperita, provavelmente. Notem que gosto do prefixo grego pseudo.

Pessoas na frente de um prédio

Descrição gerada automaticamente

 

Alguns novatos em perícia judicial me perguntaram sobre a perícia criminal. O Estado já tem esse mecanismo por meio da Polícia Civil. Ela é responsável por investigações de crimes. Então, se você vir algum curso ou mentoria tentando te vender teoria para entrar no mundo da perícia criminal, fuja, pois, uma fraude para levar seu dinheiro. O único caminho para a perícia criminal é o concurso público para Perito Criminal. Em São Paulo na Polícia Civil, na qual a escola fica dentro da Cidade Universitária, no Butantã, Academia de Polícia Dr. Coriolano Nogueira. Se tiver interesse na perícia criminal, procure um cursinho sério, aqueles geralmente ministrados por professores que foram delegados de polícia.

Os peritos criminais recebem salários fixos. Não existem comissões ou qualquer tipo de extra por cada inquérito concluído.

Talvez esses pseudomentores diga mais mentiras num vídeo do YouTube: que existe a função de assistente de acusação ou assistente técnico. Isso existe de fato, mas é muito raro que alguém te pague para trabalhar nisso. A ação penal é movida pelas Promotorias de Justiça, do Ministério Público Estadual ou Federal. Poucas ações criminais têm a iniciativa privada, as mais comuns são naqueles crimes contra a honra: calúnia, injúria e difamação. Improvável que alguém pague por um serviço de assistente de acusação nesses casos. Nesses casos, a pessoa ofendida geralmente quer sigilo e não vai lhe permitir que um desconhecido acesse fotos íntimas que acabaram na internet, por exemplo. Então, cuidado com os truques dos infoprodutos na internet.

Existe uma alternativa concreta:  concentre-se na perícia cível, portanto. Procure as ações indenizatórias. Talvez você já tenha ouvido falar na indústria do dano moral ou na indústria de indenização. Pois é a demanda real e onde você deve procurar a para entrar na realidade dos peritos judiciais que faturam algum dinheiro. Procure no Google sobre a indústria do dano moral, pois você encontrará textos das OABs sobre milhares de processos parados, com pedidos de indenização e seguidos de muitas críticas ao Poder Judiciário.

A suposta obrigação de uma planilha de honorários periciais não é complicada como os pseudomentores afirmam no YouTube. Existem duas situações: se você já é famoso; ou, se você está começando, pois não teve nenhuma nomeação ainda.

 

SE VOCÊ JÁ É FAMOSO NO PODER JUDICIÁRIO

Nunca se esqueça de somar e anotar todas os números dos processos nos quais foi nomeado, arquive no Word ou Excel. Você poderá enumerar numa lista com o número de nomeações que já recebeu (com o número de cada processo). Isso faz com que a informação seja comprovável para o juiz de direito. Nestes casos, sua apresentação de honorários pode ser escrita por meio de apenas um parágrafo. Pessoalmente, uso o número prévio de nomeações para cobrar um valor mais alto, exemplo:

Em razão da experiência acumulada em 275 nomeações, proponho R$ 11.000,00 como honorários provisórios.

Vou comprovar. Note este exemplo de um processo no qual trabalhei em 2021. Veja que ele é verdadeiro porque a assinatura digital está na margem direita (seta amarela). Naquela época, eu somava 174 nomeações, então usei essa informação para justificar meu preço, sem precisar usar uma planilha artificial de horas.

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo, Email

Descrição gerada automaticamente

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

E isso basta. Na pior das hipóteses, o juiz vai arbitrar um valor menor daquele que você pediu, contra o qual você não vai discutir. Vai aceitar e vai escrever seu laudo.

 

SE VOCÊ AINDA NÃO É FAMOSO NO PODER JUDICIÁRIO

Você deve ser concreto para aumentar o valor que você pretende cobrar. Entenda isso.

Caixa de Texto: Duas horas – leitura dos autos
Quatro horas – ida até a biblioteca da faculdade para levantamento bibliográfico
Quatro horas – realização da perícia em si
Uma hora – organização e edição das fotos periciais
Oito horas – resposta aos quesitos
Quatro horas – revisão do laudo
Total: 23 horas, com o custo de R$ 300,00 por hora, R$ 6.900,00.As planilhas com horas, ficções como “ida até a biblioteca”, “doze horas para a resposta aos quesitos” são ridículas porque são artificiais. Não escreva essas mentiras, que vão depor contra você. Ninguém vai até a biblioteca hoje em dia para pesquisar. Exemplo de uma planilha artificial:

 

Tais planilhas que os pseudomentores vendem são infoprodutos, que querem te  vender desesperadamente. Não funcionam na prática e até desacreditam o novato diante dos juízes. A dica concreta é: você vai ler os autos e sua primeira ação será enumerar as provas.

Portanto, dê um número para cada prova já na petição inicial. Nisso você já mostrou ao Juiz que está trabalhando no processo (antes mesmo de ter aceitado) e nada melhor do que trabalho concreto para poder justificar seus honorários.

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Descrição gerada automaticamente

Evite frases como: as partes deverão apresentar todas as provas que consideraram elucidativas para o caso, seja concreto, dê nome, datas e números a cada uma das provas – exames de sangue, radiografias, tomografias. Evite os pronomes indefinidos em suas petições como: muitos, vários, alguns, diversos. Use números propriamente ditos.

Quando quiser referenciar a alguma prova, use o número e talvez um recurso tipográfico, como o grifo cinza, exemplo:

Então, o implante dentário se mostrou satisfatório, conforme a radiografia (PROVA 8).

Note que não haveria como ser mais concreto do que a frase acima. Ela foi escrita na ordem direta – sujeito (implante dentário), verbo (mostrar), complemento (satisfatório) e um advérbio de lugar (radiografia) e ainda você numerou a prova.

Outro fator para valorizar seu pedido de honorários é montar uma cronologia dos fatos no processo, veja como é simples e concreto:

Tela de celular com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

Quanto mais concreto, maior confiança você passará ao juiz, que ainda não o conhece. Sugiro que não ultrapasse os R$ 3.000,00 no começo da carreira. Quando somar umas vinte nomeações, você poderá pedir um pouquinho mais, quatro ou cinco mil reais.

 

COMO FUNCIONAM AS NOMEAÇÕES NA JUSTIÇA CÍVEL

Existem três formas: por sorteio, por indicação e por fama. Os Tribunais têm um cadastro dos peritos de cada área. Se um juiz quer nomear alguém na área de Geologia, mas não conhece nenhum perito na área, ou ele sorteará ou perguntará a algum outro juiz se conhece alguém para a tarefa pericial. Portanto, temos as alternativas para receber as nomeações:

(a)   Por sorteio: quando nunca se teve uma nomeação antes, resta esperar ser sorteado. Alguns levam até três anos para ganhar a oportunidade.

(b)   Por indicação: não depende de você. Normalmente, os juízes que trabalham no mesmo fórum participam grupos de WhatsApp. Quando precisam, eles conversam entre eles.

(c)   Por fama: quando já foi nomeado muitas vezes, com um trabalho honesto, com um bom português, as nomeações surgirão.

 

Logo, se você é um novato, cadastre-se e espere. Viva normalmente, olhe sua caixa de e-mails diariamente e não cometa o erro de tentar acelerar as nomeações por meio de visitas aos gabinetes. Essa é outra mentira que os pseudomentores contam – dizem para visitar, para que você use um terno, uma gravata, imprima seu currículo e visite todos os juízes do fórum da sua cidade.

Primeiro, verá que é muito chato. Os assistentes jurídicos vão te esnobar, deixar esperando no gabinete, e se o juiz te atender, raramente te dará atenção. Segundo, você não terá nada a dizer, afinal, você nunca foi nomeado...

Talvez essa lenda de visitar os gabinetes tenha funcionado no passado, quando não existiam portais de cadastro de auxiliares de Justiça; ou quando os currículos eram impressos em papel. Quando eu comecei em 2013, os chefes dos cartórios cíveis tinham pastas arquivadas, cheias de currículos de peritos. Isso já acabou, apesar de muitos pseudomentoreses continuarem a propagar essa história nas redes sociais. Tudo foi digitalizado.

Lembro que por volta de 2014, ainda existia essa moda de levar currículos. Fiz isso no fórum de Pinheiros, em São Paulo. Pedi para falar com a chefe do cartório e chamaram uma mulher alta e mau humorada. Quando ela ouviu que eu era um “perito”, respondeu: “não estamos pegando currículos agora, já temos muitos”. Foi humilhante.

 

DICAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Essa é dica mais importante de redação jurídica - escreva sempre com ordem direta, ou ordem canônica. Evite frases indiretas como: mostrou-se satisfatório o implante dentário; estava satisfatório o implante dentário; insatisfatório estava o implante dentário. Grande volume de textos nos processos judiciais usa a ordem indireta, para parecer mais culta. Tenha a ordem direta como primeira regra para seu laudo. Na gramática[2]:

Posição do sujeito na oração

Normalmente, o sujeito antecede o predicado; todavia, a posposição do sujeito ao verbo é fato corriqueiro em nossa língua. Exemplos:

É facílimo esse problema!

Vão-se os anéis, fiquem os dedos.

“Breve desaparecem os dois guerreiros entre as árvores.” (José de Alencar)

“Foi ouvida por Deus a súplica do condenado.” (Ramalho Ortigão)

“No muro de tijolo vermelho passeavam lagartixas.” (Graciliano Ramos)

Veja esta aula que foi disponibilizada pela Escola Superior do Ministério Público em 2018. Participei desse curso excelente, paguei R$ 100,00 em 2018. Recebi um certificado assinado pelo ministrador, um professor de Linguística da Unesp.

Sobre o juridiquês:

A procura por uma linguagem rebuscada e perfeita, associada à precisão de sentido, induz o jurista à formação de sentenças truncadas, evasivas, que podem levar à falsa interpretação. Nesse caso, forma-se um abismo linguístico, em que de um lado se encontra o profissional forense e do outro a população em geral. A linguagem permanece no centro, obscura e imperfeita aos olhos da concisão (FRÖHLICH, 2015, p. 215).

 

Diagrama, Texto

Descrição gerada automaticamente

E ainda, na obra[3] que o curso do MP usou como referência:

Interface gráfica do usuário

Descrição gerada automaticamente

Como enfatizam Moreno e Martins (2011), sendo “petição inicial” uma expressão técnica, não há muito há acrescentar. Petição inicial é petição inicial. Assim, as expressões acima para “substituir” petição inicial saem, no entender de Fröhlich (2015), da esfera de meros sinônimos e entram na esfera prolixa do discurso escrito. Logo, um bom texto no campo jurídico deve ater-se as palavras e expressões técnicas, sem sombra do juridiquês.

Por enquanto, concentre-se em escrever com o sujeito antes do predicado que já estará se diferenciando da manada de aspirantes a perito judicial que as redes sociais estão tentando fabricar artificialmente.

Escreverei mais dicas depois.

São Paulo, 30 de outubro de 2024



[1] André Eduardo Amaral Ribeiro, perito com 275 nomeações em Odontologia, em outubro de 2024, andreamaralribeiro@hotmail.com

 

[2] CEGALLA, Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 2010.

[3] MORENO, Cláudio e MARTINS, Túlio. Português para convencer: comunicação e persuasão em Direito. 2.ed. São Paulo.

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